domingo, 10 de abril de 2016

Virei funcional

Descobri ontem que fiquei adulta. Ontem. Não, não fiz aniversário. Não teve um fato impactante para surgir a perspectiva. Eu só fiquei adulta e pronto, deu, era isso e só. Eu gasto meus pensamentos entre dilemas como ''devo comprar minha bebida,que é quase minha religião ou guardar o dinheiro. Vai que eu precise amanhã.'' ou ''eu deveria sair mais, me divertir... mas eu tenho que trabalhar amanhã, tenho que estudar, tenho que... Nossa, minha casa está suja'' ou ''tenho que malhar, mas tenho que meditar, mas tenho que ler, mas tenho que aprender algo novo, mas tenho que almoçar domingo com a família, mas tenho que ver meus amigos no sábado, sábado não... Tenho que ver meu namorado, temos que fazer um programa para casal, temos que nos divertir e transar, mas nossa,eu estou cansada, eu estou com sono...Prometo ficar acordada mais um pouco, mas amanhã acordo cedo. Tenho que largar uns currículos por aí...E fazer almoço, cozinhar feijão...''. E assim segue minha mente imunda, cheia de planejamentos.
Eu descobri também que fiquei adulta porque não ganho mais presentes em dias comemorativos, são raras as pessoas que se lembram do meu aniversário e ele não passa de um dia comum. E que eu tenho que pagar minhas despesas, inclusive se eu participar de um churrasco em família e tenho que ajudar com a louça, tenho que ficar na cozinha descascando batata pra fazer maionese e falar mal dos homens junto com todas as mulheres. Eu namoro já pensando no futuro. E arrumo a casa dos meus pais, porque logo terei a minha casa. Se eu matar aula, foda-se. Se eu sair, foda-se. Se eu não me cuidar,foda-se. Se eu ficar doente, foda-se. Tudo o que eu faço é por mim. Sim, a liberdade dá medo. Dá medo estar sozinha.
Eu acho um saco ler jornal, ouvir a rádio Gaúcha e ver Bom Dia Rio Grande, mas vai que caia uma tempestade ou que a Ipiranga esteja trancada, eu preciso parar meu Tom & Jerry né. Tenho que me informar. Sempre tem uma pessoa pra puxar assunto no elevador. Eu tenho que me decidir logo sobre minha vida, não cai bem estar num curso de Matemática e ler Teoria Literária,por exemplo. Tenho que passar em um concurso para ter um bom plano de saúde e não depender do SUS. O plano dos meus pais cai por terra assim que eu já tiver meus 24.
Não só meu cotidiano modificou, mas minha personalidade. Eu não tenho paciência para perder tempo, então se eu não gostar de uma pessoa,por motivos racionais... Eu simplesmente evitarei a pessoa e pronto. E seguirei minha vida. E mesmo eu sendo sozinha - mesmo com pessoas na minha volta, eu fico triste, mas procuro não aparentar, porque não terei ninguém pra cuidar de mim. As pessoas estão perdidas demais em suas rotinas, elas também não tem paciência para essas coisas. Eu me incluo. E cara, meu jeito me preocupa. Tenho que ser uma boa pessoa. Terei filhos e etc. Terei pais idosos. Terei alguém pra se ajuntar a mim.
É gostoso ser livre. Tomar conta da vida, das escolhas. Mas eu acho que não sou adulta. Eu morro de medo. E a única coisa que eu penso é ''Ah,meu deus, como eu queria ter meu velho vinho pra dormir comigo junto com meus desenhos da TV Cultura''.

É

Eu ainda não sou adulta.

Ainda bem. Eu acho.
E que texto bosta, mas verdadeiro.

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